Tive
uma infância maravilhosa! Eu e minha mãe Márcia Marques Cruz
morávamos com meus avós e nunca me faltou nada: estudei nas
melhores escolas, aprendi a nadar com 3 anos, fiz sapateado,
equitação e volteio. Sou apaixonada por cavalos, adoro desenhar e
amava ficar na água, nadar, brincar...íamos constantemente para
Maresias.
Quando eu tinha 14 anos, minha mãe se casou com Marcelo Zampieri e, 2 anos depois, veio minha irmã Mariah.
Em
meados de 2009, minha família se mudou para Águas de São Pedro
mas eu preferi ficar com meus avós. Não queria mudar de faculdade
- tinha escolhido estudar Direito, embora meus planos nunca tenham
passado nem perto disso, pois sempre tive como sonho a arte - e
também fazia estágio e não queria parar.
Em
2010, com 22 anos, eu já estava
no 3º ano do curso e fazia estágio havia um ano no Juizado
Especial Cível em São Paulo.
Fui
passar as férias de julho na casa da minha mãe em Águas de São
Pedro e, logo que cheguei, minha mãe percebeu que eu estava andando
meio atrapalhada, tipo perdendo o equilíbrio. Eu lhe disse que
tinha machucado o pé, por isso estava andando daquele jeito. Passei
os 20 dias sem muito caminhar para ninguém me encher o saco.
Quando
voltei para São Paulo, minha mãe pediu para que eu caminhasse mais
porque era falta de exercício. Então peguei minha avó e fomos
caminhar na praça. Tomei um tombo que me esborrachei. Aí começou o
meu calvário.
Fui
ao ortopedista porque havia batido o joelho, graças a Deus não
quebrei nada, mas sentia um peso grande na panturrilha , como se
estivesse usando uma tornozeleira de 4 kg em cada perna, e tontura.
Recorri
então a Cecilia
Monte Alegre (Ciça),
minha amiga, pessoa maravilhosa que participou da minha infância e
me incentivou a desenhar cada vez mais. Seu pai, Dr.
Afonso,
era excelente otorrino, pessoa maravilhosa, quem sabe eu não
estivesse com labirintite, né?
Pois
é, eu estava com uma pequena inflamação, foi tratada, mas como a
tontura continuava, fui ao vascular, e nada, a coisa só piorando, já
era setembro e eu andava agora escorada pelas paredes. Minha mãe
conversou com minha prima Eliana,
psicóloga (pessoa fantástica, de coração enorme) a meu
respeito, porque eu já estava achando que tinha uma doença que
ninguém conhecia e ia morrer, tinha que ir a uma psicóloga para por
para fora tudo o que eu estava sentindo naquele momento...e também
ela deu a ideia de falar com outro primo, o Dr
José Roberto (Betinho)
para fazer uma tomografia do crânio e ver se tinha ou não alguma
coisa rssss…. É rir para não chorar… A tomografia foi feita, e
nada, tudo em ordem.
Foi
aí que a Eliana conversou com uma prima dela, a Dra.
Marília
(ela é um dos motivos do meu nome e uma profissional extremamente
competente). Ela marcou uma consulta com um neurocirurgião
americano que estava fazendo pesquisa sobre partes motoras superior
e inferior do corpo. Fui à consulta, fizeram ressonância da coluna,
onde foi constatada uma pequena inflamação. Não era tumor, então
teria que passar por um neurologista. Como estava na Santa Casa,
ficamos aguardando o agendamento. Já era dezembro, eu já subia as
escadas da casa da minha avó sentada e minha mãe pediu para minha
avó alugar uma cadeira de rodas para eu poder terminar o ano na
faculdade.
Passaram-se
dois meses, já era fim de fevereiro, e a consulta ainda não tinha
sido agendada.
Foi
aí que minha tia Miriam
(Mimi),
marcou consulta com o Dr.
Charles Peter Tilbery
no Hospital Albert Einstein. Fomos à consulta com uma penca de
exames...nunca havia ficado doente e de repente estou numa cadeira de
rodas com alguma coisa que médico nenhum descobria, estava
definhando a cada dia. Ele olhou todos os exames e pediu que me
levassem na sexta-feira (a consulta foi numa segunda) para a Santa
Casa pois eu iria ser internada e fazer uma série de exames para
poder chegar a um diagnóstico. E fomos para lá, eu, minha mãe,
minha tia Mimi e minha avó. Fiquei internada 10 dias, fiz
ressonância quase que do corpo todo, com contraste, sem contraste,
exame de líquor, sangue, urina, vitaminas e nem sei mais o quê. Até
que no 4º dia, o Dr. Charles (considero como um dos meus anjos da
guarda até hoje) e sua equipe entram no quarto e dizem que já têm
o diagnóstico : Esclerose Múltipla.
MEU
MUNDO CAIU.
Não
fazíamos a menor ideia do que era, ele foi explicando para a minha
mãe a doença. Simplificando: “A
Esclerose Múltipla (EM) é uma doença neurológica, crônica e
autoimune – ou seja, as células de defesa do organismo atacam o
próprio sistema nervoso central, provocando lesões cerebrais e
medulares, não tem cura”.
E
eu ali desacreditada (literalmente de tudo), na cama, já nem
conseguia mais mexer as pernas. Chorei, e até hoje não sei se de
felicidade, porque pelo menos eu já sabia que não ia morrer mais,
ou se de tristeza, por saber que não tem cura. Ele falou sobre o
tratamento e a pulsoterapia que eu iria fazer para poder tentar
reverter uma parte da lesão, causada pelo primeiro surto que tive,
havia oito meses, que atingiu os membros inferiores. Em
todo esse período, foi um sofrimento para toda a minha família,
meus avós estavam se entristecendo mais a cada dia.
Desse
dia em diante minha vida mudou. Não poderia mais continuar a
faculdade de Direito pois o estresse leva ao surto e eu já tinha um
enorme problema para resolver, não teria condições de resolver o
problema dos outros, né? É muita carga rssss….
Após
sair da internação, recebi a visita da minha amiga-irmã Priscila
Henriques
que nunca me deixa se sentir só.
Fiz
fisioterapia na Santa Casa 3 vezes na semana, e em 4 meses consegui
sair da cadeira de rodas e andar de bengala, a qual me acompanhou
por 2 longos anos.
Com
um ano andando de bengala, digo andando mas na realidade eu não ia e
não queria ir para lugar nenhum e , dia sim, dia não, tomando
medicamento que me deixava com febre de 40º e provocava vômitos
(isso também por 2 longos anos), fui morar com minha mãe em Águas
de São Pedro.
Logo
que cheguei, minha mãe me deu a notícia de que eu daria aula de
Inglês voluntária para as crianças do 1º ao 5 º ano do Programa
Educacional Girassol. Agradeço a Mônica
De Mitry
que me deu a oportunidade.
Falei
para mamãe que ela estava louca, que eu nunca gostei de criança,
não tinha jeito para me comunicar com elas, não ia dar certo.
Massss... como ela já havia se comprometido, lá fui eu de bengala e
tudo dar aula. E não é que eu amei? Foi superdivertido, no
intervalo eles queriam saber porque eu usava a bengala, se eu tinha
sofrido um acidente, etc. Achei uma luzinha no fim do túnel. Dei
aula para eles de setembro a dezembro e, por conta disso, começaram
a aparecer crianças querendo aula particular de Inglês.
Cheguei
a dar aula na Tia
Leninha (um
amor de pessoa), escola particular em São Pedro, para os alunos do
6º ao 9º ano. Comecei então a me dedicar a estudar, estudar,
estudar, estudar e a dar aulas. Fiz nessa época algumas aulas de
hidroginástica com a professora, técnica e amiga Simone
Fachi.
Exatamente
com 2 anos de bengala, tive outro surto e novamente foram atingidos
os membros inferiores, ou seja, as pernas. Dessa vez não teve jeito,
parei na cadeira de rodas. Agora eu já não andava mais, não sentia
mais as minhas pernas, tinha incontinência, precisava de ajuda o
tempo todo. Mas mesmo sendo cadeirante, continuei a dar aulas na
escola até o final do ano e particular em casa. Começou a ficar
muito puxado e decidi ficar somente dando aulas em casa.
Graças
a Deus, anjos sempre apareceram ao longo da minha vida, primeiro foi
a Nanci
Tomsic,
vinha uma vez por semana fazer massagem, hummmm... que delícia, a
massagem e a companhia; aí a Nathalia
Badra
me indicou outro anjo, a Denise
Borges,
fisioterapeuta e amiga, muito divertida. Trabalhou por 20 anos na
AACD e com toda a sua experiência ajudou a minha mãe, ensinando
como me colocar e tirar do carro com mais facilidade, como me colocar
na cama etc. Desde então faço Fisio com ela, para mim, dia muito
esperado, pois é quando tenho vontade de sair!
Quando
comecei a fisio, eu dormia com as pernas presas na cama pois tinha
movimentos involuntários: as pernas subiam e eu não conseguia
fazê-las descer, meu tronco não parava, eu ia de um lado para o
outro sem conseguir controlar. Hoje minhas pernas estão mais
comportadas... rssss... não dormem mais amarradas, e minha coluna
eu já consigo controlar (vejam vídeo na academia). Outro anjo é a
Aline
Ingridy Costa do
apiário Bella Flora, que faz apiterapia e acupuntura. Vinha em casa
uma vez por semana fazer aplicação de abelha. Cheguei a tomar 30
picadas...rssss... entre as pernas, na coluna e na cabeça, e foi
isso que vez com que minha sensibilidade nas pernas voltasse e fez
parar a incontinência. Fiz tratamento com Vitamina D também, mas
essa não me fez muito bem, me sentia fraca.
Minha
mãe, desde que fui diagnosticada, pesquisa sobre a doença
procurando alternativas médicas, estudos, enfim, tudo relacionado.
Ano
passado tive outro surto, dessa vez foi no olho esquerdo, fiquei com
nistagmo, meu olho esquerdo tem movimentos involuntários sem parar
de um lado para o outro, então eu não consigo focar,
consequentemente não consigo enxergar direito, é pra acabar, né?
Por causa disso, é difícil desenhar, pintar, me maquiar, que eu
também amo, e até ler e escrever... e se tem uma coisa que eu amo
fazer é ler. Espero impaciente as feiras de livros que acontecem
aqui na cidade, é outro motivo para eu querer sair. Ir à feira de
livros e encontrar meus amigos Lello
e Roberta Beltrami Verrengia,
donos da Livraria Zuiza, que sempre são muito carinhosos e
atenciosos comigo.
Desde
o ano passado passei a fazer tratamento com o Dr.
José Roberto Kater,
nutrólogo e medicina quântica, tenho me sentido cada vez melhor.
Agora
estou em uma nova fase, por isso dei este nome ao meu blog: MEU
DESPERTAR NA CADEIRA DE RODAS.
É isto o que eu sinto, um DESPERTAR, e quero agradecer de uma
forma especial a Priscila
Maria de Paula,
que abriu uma porta enorme para eu voltar a fazer uma das coisas que
mais gosto, que é ficar na piscina. Seus filhos Pedro
e Matheus que são autistas e fazem natação na APIN Natação
Paradesportiva de Alto Rendimento. Equipe de Natação Paralímpica
Grupo de Base. Minha mãe esteve na loja dela aqui em Águas e foi
dar os parabéns ao Pedro pelo seu desempenho num campeonato de
natação que aconteceu mês passado. Por conta disso, minha mãe
começou a perguntar como era, como funcionava, etc., e ela nos
convidou para assistirmos a um treino no sábado, eles acontecem em
Indaiatuba. Minha mãe disse que ficaríamos muito felizes em ir. Na
sexta a Priscila mandou mensagem para minha mãe, dizendo para
levar maiô, óculos, toalha etc, porque se desse eu já faria um
teste.
Vê
se pode, há mais de uma década não nado, agora vivo numa cadeira
de rodas, dependendo das pessoas (mãe) para muitas coisas, ainda bem
que minha mãe não me falou nada e somente disse que se eu quisesse
entrar na piscina, pelo menos já estava com as coisas.
Acordamos
e às 5h30 da manhã a Priscila passou em casa para me pegar, assim
como minha mãe e minha irmã Mariah, minha incansável
incentivadora. Eu estava em ponto de bala, nervosa, irritada, com
medo, tensa, insuportável ...rsssss... chegamos lá e...vi a
felicidade dos atletas, alguns com deficiência visual e física,
na qual me enquadro, e outros, com deficiência intelectual, todos
determinados, focados em dar o seu melhor.
O
técnico Júlio
Pistarini veio
conversar comigo, e logo depois pediu para eu colocar o maiô para
fazer um teste. Meu desespero foi instantâneo, fomos eu e minha mãe
ao banheiro para eu me trocar, a Mariah estava também ansiosa do
lado de fora nos aguardando.
Vocês
não fazem ideia do que é colocar um maiô sentada numa cadeira de
rodas... rsss... Esquecemos que o maiô é de lycra e escorrega no
assento da cadeira, pois é, eu escorreguei, e minha mãe fez um
esforço descomunal para me colocar sentada novamente. Aí eu
espanei...kkkkkkk... já fui avisando, se for para ser assim toda vez
que vier, então ia ser a última vez ...rsssss... e eu,
bicuda...bom, saímos do banheiro e fomos em direção à piscina.
O técnico explicou para minha mãe como ela deveria me segurar para
os dois juntos me colocarem na borda da piscina. E assim foi feito.
Gente!!!!! Quando entrei na piscina parecia que eu estava em outro
mundo, que sensação mágica, instantaneamente me veio à memória a
minha infância... minha mãe me disse que minha fisionomia mudou
tanto, que a Mariah começou a chorar de emoção em ver minha
felicidade.
Afinal
de contas, eu cheguei a pensar que nunca mais conseguiria nadar e nem
estar dentro de uma piscina de novo. Fiz o teste e, por incrível
que pareça, eu PASSEI!!!!! Agora faço parte da equipe de base de
natação paralímpica.
Como
se não bastasse, os anjos continuam aparecendo: sem saber de nada, o
Israel
Magno,
que já foi professor de Judô da Mariah (ela tem várias medalhas no
Judô sob sua orientação) e é também professor de Educação
Física, abriu na cidade uma academia funcional. Além de ser amigo
de todos aqui em casa, para mim é outro anjo e me ofereceu aula
funcional 2 vezes por semana. Como minha irmã me disse “desse
jeito você vai ficar marombada” rssss….
Então,
a partir de agora vou postar todas essas atividades de fisioterapia
com a
Denise Borges,
Academia Funcional com o Professor
Israel Magno
e Natação com o Técnico Júlio
Pistarini,
minhas evoluções, limitações, dificuldades, como estou voltando a
fazer todas as coisas de que gosto, dentro de minhas limitações.
Transmitirei em vídeo para que possa ajudar a outros que estejam em
cadeira de rodas ou que tenham as mãos já não tão firmes como
eram, e principalmente trocar informações, seja com deficientes,
com seus parentes, amigos …..estou focada a reaprender a VIVER,
agora com letras maiúsculas, com o que sou hoje, com o que eu tenho
hoje e aprimorar cada vez mais, saúde, corpo, mente e muita
diversão…..força,
foco e fé…..
Dedico este Blog e agradeço de coração a Família Cruz por toda a ajuda emocional e financeira que deram a mim e a minha família; aos meus avós Vera e Rubens, meus tios Junior, João e tia Mimi que não mediram esforços para me ajudar; primos João Victor, Fabi e Simone e Laiza que mesmo distante me dão a maior força; a minha mãe Márcia Marques Cruz, Marcelo Zampieri e minha irmã Mariah meus incentivadores e que estão para o que der e vier; a Nívea Zampieri, que era a ouvinte da minha mãe, amiga-irmã que nos ajudou muito e continua ajudando, a Alessandra Bomfate que quando me mudei para Águas se preocupou em como eu receberia a medicação de alto custo aqui na cidade, enfim; todos que sempre se preocuparam e tudo fizeram para que nada me faltasse; a Mari Zampieri, Martha Zampieri, Luiza Fernandes e Gino, Elza Marim e Mauro, por todo o carinho e motivação que sempre me deram. E a todos os amigos anjos que cruzaram e continuam cruzando o meu caminho.
Isso porque no início eu disse que era só um pouquinho da minha vida rssssss…..mas agora será um pouquinho a cada dia….
Agradeço de coração a amiga de minha mãe Lourdes Bicudo pela revisão do texto e para a Ciça que fez o Logo
Talvez alguns pensem, nossa, mas porque demorou tanto tempo? Mas digo com propriedade, não é fácil, é muita frustração, muita raiva, muita tristeza, muitas limitações, chorei muito e ainda choro, e acabamos nos fechando para o mundo, para as pessoas, para as oportunidades.
Não adianta as pessoas insistirem, nós não queremos ouvir, até que um dia alguém ou alguma coisa nos desperta. Esse dia chegou para mim e tenho certeza que chegará para muitos que passam ou passaram o que eu passei e ainda estou passando, mas agora com determinação, com clareza, com mudanças de atitude, caminho para viver realmente tudo o que estiver ao meu alcance, e é o que desejo para todos vocês. BORA VIVER...